quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Ilha

Eu já morei numa ilha. Tinha dezoito anos e todos as coisas pareciam possíveis. Eu era bonita. Era magra. Era professora. Era jovem. Mudei muito desde então.
Quando saímos de casa pela primeira vez o mundo e suas possibilidades nos parecem enormes, não é? Não sei porquê fui me enfiar mo meio dum pedaço de terra cercado de mar e distâncias por todos os lados.
Mentira, eu sei sim. Era uma chance de beleza. E afinal de contas, o lugar era um importante roteiro turístico para gente do mundo todo. Porque não? Pensei.
Só que o mundo acabava por não me visitar-me ali, onde eu ia enlouquecendo aos poucos.Continente só de seis em seis meses. Não existia a internet. A comunidade era muito fechada, trabalhar com ela exigia cabeça baixa e não relacionar-se com os de fora. Obedeci a essa lei não-oficial, porém clara.
Lembro que brincava de musa para o divino, num percurso comprido, de horas, por praias desertas e rochas. Deixava a canga voar ao sabor do vento, imaginando como devia estar bonita naquela cena, imaginava roteiros onde homens lindos e de olhos de mar me veriam e se apaixonariam perdidamente. Falava sozinha.
Também lia muito. Bebia muito vinho. Trabalhava em excesso.
Então um dia, depois de um ano e muitos meses, minha mãe foi me visitar. Quando decidiu dar por encerrada sua estadia, larguei tudo e voltei com ela.
Vez por outra, me flagro pensando o que teria acontecido seu eu tivesse ficado, casado com o nativo que namorei por uns tempos. Também sonho muito com esse lugar. Nos meus sonhos apareço tanto muito jovem, há tantos anos atrás, como retornando agora. Dizem que a ilha está muito diferente. Talvez por isso, neles aparecem lugares que nunca conheci, mas sei que não estão lá.
A questão é que tenho sentido a mesma ansiedade que me fez querer ir embora da ilha. Aqui. Agora. Como se essa segunda cidade que escolhi depois da minha, anos depois, estivesse diminuída. Sabe quando voltamos para uma casa que julgávamos enorme quando éramos crianças e tudo parece menor, menos grandioso? Talvez isso aqui me bastasse quando eu estava casada, em dia com as contas e com o tempo.
Hoje? Não sei... não sei...
Aos dezoito anos aquela ilha também me parecia muito, muito pequena. Será que se eu voltasse lá agora ocorreria o efeito contrário? Tudo estaria agigantado?
Porque hoje eu sei, a ilha sou eu.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Como é que faz pra sair da ilha? Pela ponte, pela ponte.."

Como é que faz pra voltar pra ilha? "Esse lugar é uma maravilha!"

muak!

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